Alienação Fiduciária de Bens Imóveis recebe modificações legislativas relevantes

Alienação Fiduciária de Bens Imóveis recebe modificações legislativas relevantes

A Lei nº 9.514/1997 introduziu importante instituto no ordenamento jurídico brasileiro: a alienação fiduciária de bens imóveis. Trata-se de modalidade de garantia que permite ao devedor transmitir ao credor a propriedade resolúvel de um bem, com possibilidade de excussão extrajudicial em caso de inadimplemento do devedor, consolidando-se a propriedade do bem imóvel ao credor fiduciário.

Presente no ordenamento desde a edição da Lei nº 4.728/1965, que regula a sua utilização pelas instituições pertencentes ao Sistema Financeiro Nacional no tocante ao financiamento de bens móveis, a alienação fiduciária, com o advento da Lei nº 9.514/1997, representou importante contribuição à evolução do mercado de crédito imobiliário, uma vez que conferiu maior celeridade aos procedimentos adotados pelos credores na recuperação de seus créditos, principalmente se comparado ao custo e morosidade verificados na execução das garantias até então predominantemente utilizadas no setor imobiliário, como a hipoteca, o penhor e a anticrese.

Em suas duas décadas de existência, modificações atingiram a lei de regência que instituiu a alienação fiduciária de bens imóveis; mais recentemente, em julho de 2017, promovidas pela Lei nº 13.465/2017.

A primeira alteração relevante trata do procedimento de consolidação da propriedade do imóvel dado em garantia fiduciária. Na esteira da sistemática de citações e intimações previstas pelo novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), o artigo 26 da Lei nº 9.514/1197 foi complementado pelos parágrafos 3º-A e 3º-B, por meio dos quais se introduziu a citação “por hora certa” oriunda da legislação processual.

Em síntese, os dispositivos em questão permitem que, quando a intimação pessoal do devedor fiduciante for infrutífera em duas oportunidades, será possível intimar-se qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho, comunicando esses indivíduos de que, no dia útil imediato, a intimação será efetuada no imóvel, em hora previamente designada. Em caso de condomínios edilícios, o destinatário de referida comunicação poderá ser o funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência.

Trata-se de modificação relevante em comparação ao cenário anterior, no qual a intimação apenas poderia ser feita à pessoa do devedor fiduciante, de seu representante legal ou do procurador por ele constituído.

Outra modificação importante vem a ser a introdução do § 2º-A ao artigo 27 da Lei de nº 9.514/1997, por meio do qual se estabeleceu a obrigação de se comunicar o devedor acerca das datas, horários e locais dos leilões do bem alienado fiduciariamente, de modo que tal comunicação deverá ser feita mediante correspondência a ser dirigida aos endereços constantes do contrato e ao endereço eletrônico do devedor. Esta alteração ganha importância à medida que, no cenário anterior, ante o silêncio da lei, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça apenas aceitava a validade da arrematação do imóvel alienado fiduciariamente caso a intimação do devedor houvesse sido efetuada pela via pessoal, exigência esta que, não raro, tornava excessivamente morosa a recuperação do crédito pelos credores.

A obrigatoriedade de comunicação do devedor acerca da realização dos leilões públicos, aliás, encontra-se diretamente relacionada a outra modificação trazida pela Lei nº 13.465/2017, que vem a ser o estabelecimento de um direito de preferência ao devedor fiduciante na aquisição do imóvel. Assim, de acordo com o § 2º-B da Lei de nº 9.514, passa a ser possível a quitação da dívida pelo devedor fiduciante mesmo após a consolidação da propriedade no patrimônio do credor fiduciário. Para que tal ocorra, entretanto, o direito de preferência deverá ser exercido antes da ocorrência do segundo leilão, de modo que o devedor terá a obrigação de arcar com as despesas relativas ao imóvel suportadas pelo credor.

Já no tocante à realização dos leilões em específico, a Lei nº 13.465/2017 traz disposições que conferem maior segurança jurídica à arrematação dos imóveis. Isto, porque preencheu lacuna da Lei nº 9.514/1997, atribuindo-lhe critério para a definição do valor mínimo de arrematação do bem, o qual será fixado a partir do valor venal do imóvel utilizado como base de cálculo do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI), recolhido quando da consolidação da propriedade do imóvel.

Com isso, evita-se a proliferação de demandas até então bastante comuns, de cunho meramente protelatório, que visavam à desconstituição da arrematação de imóvel sob o argumento de que a alienação ocorrera mediante o pagamento de preço vil, o que, conforme entendimento predominante do Superior Tribunal de Justiça, se caracterizava quando o bem era arrematado por quantia inferior a 50% (cinquenta por cento) do valor originalmente atribuído pelo laudo de avaliação.

Por fim, também se verifica relevante a alteração no que se refere à taxa de ocupação do devedor fiduciante, que vem a ser o valor cobrado do devedor que, a despeito de estar em mora, não desocupa o imóvel no prazo legalmente previsto. Anteriormente, a taxa em questão era calculada a partir da alienação do bem em leilão, conforme a jurisprudência do STJ sobre o tema; a partir de agora, entretanto, o artigo 37-A determina que o cálculo terá início a partir da data da consolidação da propriedade no patrimônio do credor fiduciário, medida esta que representa importante ferramenta coercitiva para impedir que o devedor permaneça no imóvel indefinidamente.

Não obstante possuam conteúdo fomentador da celeridade e segurança jurídica na recuperação do crédito, as alterações legislativas mencionadas precisarão ser incorporadas pela jurisprudência, de modo a efetivamente aprimorar instituto tão relevante ao mercado de crédito imobiliário.