CVM entende que Contratos de Empréstimo com Alienação Fiduciária em Garantia Podem Servir de Lastro para Emissão de CRI

CVM entende que Contratos de Empréstimo com Alienação Fiduciária em Garantia Podem Servir de Lastro para Emissão de CRI

Em reunião realizada no dia 16 de janeiro, o Colegiado da Comissão de Valores Mobiliários – CVM decidiu que contratos de empréstimo pessoal com pacto adjeto de alienação fiduciária de imóvel em garantia, comumente chamados no jargão de mercado de operações de home equity, poderiam servir de lastro para emissão de certificados de recebíveis imobiliários – CRI.

Nem a Lei nº 9.514/97, que dispõe sobre o sistema de financiamento imobiliário, nem a Instrução da CVM nº 414, que dispõe sobre as ofertas de CRI, definem expressamente o que se entende por crédito imobiliário e, por isso, a CVM vem construindo este conceito no caso a caso, por meio das decisões de seu Colegiado.

No presente caso, os regulados buscavam estruturar uma operação de CRI lastreada em contratos de empréstimo pessoal com pacto adjeto de alienação fiduciária de imóvel em garantia. Tal estrutura não havia sido aprovada pela Superintendência de Registros de Valores Mobiliários – SRE, com base no argumento de que os créditos em questão não poderiam ser considerados imobiliários por (a) não decorrerem da exploração de um imóvel, nem tampouco (b) serem os respectivos recursos desembolsados destinados à aplicação em um imóvel, isto é, para aquisição, construção ou reforma de um imóvel. Diante da negativa da SRE, os regulados apresentaram recurso ao Colegiado da CVM.

O referido órgão reverteu a decisão da SRE por entender que, ao outorgar garantia real sobre seu imóvel, o proprietário percebe um benefício econômico decorrente diretamente da propriedade do imóvel, obtendo recursos a custos reduzidos. Ainda, o valor de alienação do bem é vinculado diretamente à satisfação do crédito devido, pois o credor teria a segurança de receber a prestação devida, seja pelo pagamento efetuado pelo devedor, seja pela execução da garantia, em caso de inadimplemento. Com base nestes argumentos, o crédito oriundo de operações de home equity possui, na visão do Colegiado, caráter imobiliário para fins de emissão de CRI.

Com relação ao caso específico, o Colegiado embasou seu entendimento, ainda, no fato de o originador dos créditos ser companhia hipotecária, constituída com o fim exclusivo de conceder empréstimos e financiamentos garantidos por alienação fiduciária de imóveis, o que tornaria a utilização dos empréstimos como lastro para a emissão de CRI fator de expansão das atividades desempenhadas do mercado imobiliário.

O Colegiado indicou, também, entender que sua decisão promove coerência regulatória por estar alinhada às regras adotadas pelo Banco Central do Brasil – BACEN e pelo Conselho Monetário Nacional – CMN na qualificação de créditos imobiliários para fins de emissão de letras de crédito imobiliário – LCI e de letras imobiliária garantida – LIG, cujas regras já permitiam a utilização de créditos tais como aqueles objeto de análise da Autarquia.

Por fim, o Colegiado destacou que a análise técnica da SRE não identificou riscos aos potenciais investidores do CRI ou ao bom funcionamento do mercado de valores mobiliários, caso o crédito em questão fosse utilizado como lastro do CRI. Pelo contrário, o colegiado da CVM entendeu que o fato do crédito imobiliário lastro do CRI contar com garantia fiduciária imobiliária tenderia a atenuar os riscos assumidos pelos potenciais investidores do CRI.

Importante ressaltar que a decisão da CVM não foi unânime, tendo dois dos cinco diretores da CVM acompanhado o entendimento da SRE e votado pelo não provimento do recurso.  Para os diretores vencidos, segundo a Lei nº 9.514/97, também o crédito, e não apenas sua garantia, deveria estar vinculado a uma origem ou destinação imobiliária, e mera existência de garantia imobiliária, que é um acessório, não teria o poder de transformar a natureza do crédito em si, que é relação jurídica principal à qual a garantia (acessória) se subordina.

Com relação ao argumento de coerência regulatória, referente ao entendimento do BACEN e do CMN à LCI e à LIG, os diretores divergentes entenderam que se trata de instrumentos de natureza e com especificidades diversas, não vinculando a decisão da CVM. A título de exemplo, foi mencionado que a composição da carteira de ativos que lastreia a LIG seria mais flexível, podendo ser composta por até 20% de títulos públicos, exceção essa não aplicável ao CRI e que, enquanto o CRI é emitido por companhias securitizadoras, LCI e LIG somente podem ser ofertadas por entidades autorizadas a operar do Sistema de Financiamento Imobiliário, atingindo assim naturalmente o objetivo legal de financiamento imobiliário.

A decisão tomada pelo Colegiado da CVM aclara questão há muito debatida pelo mercado de capitais brasileiro e traz maior segurança jurídica para operações semelhantes a serem estruturadas no futuro, tornando o CRI com lastro em operações de home equity uma nova fonte mais barata de captação de recursos para instituições financeiras, o que poderá contribuir para a diminuição do custo de crédito no país de um modo geral.

 

Equipe de Direito Bancário e Mercado de Capitais – VBSO Advogados