O DISTRIBUIDOR DE INSUMOS COMO AGENTE DE CRÉDITO RURAL – RESOLUÇÃO BACEN 4.631

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O DISTRIBUIDOR DE INSUMOS COMO AGENTE DE CRÉDITO RURAL – RESOLUÇÃO BACEN 4.631

Pequenas mudanças indicam o início de uma revolução no ambiente de distribuição de insumos no país. Setor antes voltado apenas para mediar vendas de insumos, muitas vezes com margens apertadas, vai gradualmente se reinventando. A evolução das operações de troca (barter), foi um passo importante para colocar essas empresas rurais no ambiente de prestação de serviços de comercialização. Com a oportunidade de integrar  operações estruturadas, tais como CDCA (Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio) e o CRA (Certificados de Recebíveis do Agronegócio), títulos criados em 2004, deram mais um passo na direção do mercado financeiro e de capitais.

Mais recentemente, com um movimento de consolidação do setor em curso, através de aquisições operadas por fundos de participação, a “financeirização” se acelera nesse mercado. Mesmo empresas que não foram adquiridas, começam a investir nos seus backoffices para maximizar resultado e melhorar a imagem e valor de mercado. Investir na “bancabilidade” nessas empresas, parece se tornar agora uma questão de sobrevivência.

Entendendo a capilaridade operacional do crédito rural e atento à atual dinâmica dos negócios realizados entre produtores rurais, agentes intermediários e instituições financeiras, o Banco Central do Brasil, por meio da Resolução nº 4.631, de 22 de fevereiro de 2018, passou a permitir a contratação de agente para intermediação de negócios realizados no Sistema Nacional de Crédito Rural.

Em virtude de imposições legais e regulatórias, determinadas instituições financeiras são obrigadas a operar no sistema de crédito rural como forma de estimular o setor por meio de crédito subsidiado pelo governo aos produtores rurais. Trata-se de uma forma de estimular o agronegócio brasileiro. Porém, por falta de capilaridade operacional, muitas vezes repassam suas linhas para a indústria de insumos indicar proponentes ao crédito (produtores ou cooperativas). Hoje além das linhas de crédito rural, existem outras oportunidades negociais com o campo. As emissões de LCAs vêm crescendo exponencialmente com a queda da taxa CELIC e a escassez de linhas subvencionadas.

Neste sentido, o crédito rural, em linhas gerais, deve ter as seguintes finalidades: (i) crédito de custeio, destinado a cobrir despesas normais dos ciclos produtivos; (ii) crédito de investimento, destinado à aplicação em bens ou serviços cujo desfrute se estende por vários períodos de produção; e (iii) crédito de comercialização, destinado a cobrir despesas próprias da fase posterior à colheita ou a converter em espécie os títulos oriundos de sua venda ou entrega pelos produtores ou suas cooperativas.

Considerando a destinação do crédito rural, essa nova alternativa oferecida à referidas instituições financeiras por meio da Resolução buscou facilitar ainda mais a oferta de crédito aos produtores pela via de agentes que estão mais próximos ao produtor. Nesse caso, sob o ponto de vista estratégico, ninguém melhor que os distribuidores de insumos para preencher esse espaço, haja vista que já operam rotineiramente na concessão de crédito aos agricultores.  disponibilização e obtenção do crédito pelos produtores rurais, tornando o sistema mais dinâmico e eficiente.

A contratação do agente pelas instituições financeiras deve observar as disposições relativas ao contrato de agência do Código Civil brasileiro, especificamente em seus arts. 710 e seguintes. De acordo com referido diploma legal, por este contrato uma pessoa deve promover, angariar ou intermediar negócios em benefício de outra pessoa, mediante pagamento e em determinada zona.

Não deve se confundir este contrato, de forma alguma, com o vínculo empregatício determinado pela legislação trabalhista e previdenciária, visto que inexiste relação de dependência ou relação de emprego. Não deve ser confundido também com o contrato de distribuição, o contrato de representação comercial ou o contrato de corretagem, cujas características são distintas do contrato de agência.

Em adição ao quanto previsto no Código Civil brasileiro, a própria Resolução tratou de definir algumas das características da contratação do agente para atuar no sistema de crédito rural.

Assim, o agente deverá atuar por conta e sob as diretrizes da instituição financeira contratante, ficando esta responsável por garantir a integridade, segurança, confiabilidade, sigilo e conformidade com a legislação e regulamentação aplicável. Além disso, poderão figurar como agente as pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado, desde que com comprovada capacidade técnica e operacional.

Sob o ponto de vista operacional essa resolução surge como uma grande oportunidade para as empresas distribuidoras de insumos, que poderiam agregar esse serviço de agenciamento de crédito no seu portfólio de serviços. Por coincidência, esse setor passa por uma profissionalização das suas áreas de crédito, com automação de processos e governança documental, o que permitiria um rápido enquadramento nas regras propostas pela instrução do BACEN.

A Resolução estabelece também os serviços que o agente poderá prestar, sendo: (i) preenchimento de dados cadastrais; (ii) recepção, análise prévia e encaminhamento de propostas, projetos, planos simples e documentação; (iii) orientação sobre as normas relacionadas ao crédito rural, seguro rural, Proagro, dentre outras; (iv) fiscalização sob a integral responsabilidade da instituição financeira contratante; (v) notificar o produtor rural e enviar avisos de cobrança não judicial; e (vi) guardar a documentação relativa às operações de crédito rural na qualidade de fiel depositário. Atividades que já são conduzidas corriqueiramente pelas empresas de distribuição mais estruturadas. Vale ressaltar que, como os distribuidores já atuam como financiadores no âmbito comercial, a inserção de uma nova operação só terá êxito se preservar uma autonomia operacional. Grande parte das operações de crédito desses agentes são “encarteiradas” ou repassadas para os fornecedores (indústria de insumos), que ainda serão importantes parceiros com a oferta de insumos a prazo safra e também acessarão parte dos recebíveis desses agentes (clientes).

Outro ponto abordado pela Resolução refere-se à obrigatoriedade de que o contrato de agência possua todas as atividades e atribuições do agente, incluindo suas obrigações e remuneração. Ainda, a Resolução autorizou o Banco Central a baixar normas e adotar medidas adicionais visando a preservação da contratação de agentes no âmbito do crédito rural.

Sob o ponto de vista operacional, vedou-se também ao agente de crédito operar com sistema próprio de registro das operações de crédito rural, distinto do sistema utilizado pela instituição financeira contratante. Nesse contexro, hoje já existem plataformas que permitem a integração operacional entre originadores de títulos de crédito e instituições financeiras. Essas plataformas, que são usadas nas operações de crédito comercial, podem ser instaladas nos bancos de maneira a satisfazer a norma e permitir uma operação interativa, com governança, sigilo e parametrização pela instituição financeira.

Importante destacar que a Resolução impede que os custos relacionados à contratação do agente sejam repassados ao produtor rural, evitando assim um aumento dos custos de contratação do crédito rural e mantendo, desta forma, a intenção original do sistema de crédito rural, qual seja, a disponibilização do crédito a baixo custo aos produtores rurais e o incentivo à expansão do setor.

Diante de todas estas características determinadas pela Resolução, é possível afirmar, desde já, que se trata de uma regulamentação de fundamental importância para facilitar a obtenção do crédito rural pelos produtores rurais, além de ampliar da oferta entre instituições financeiras autorizadas a atuar no Sistema Nacional de Crédito Rural. Tudo indica que o objetivo do BACEN é o de permitir uma maior capilaridade operacional, sobretudo para os bancos de menor porte, que não possuem rede de agência nas localidades rurais. Nesse ponto, uma maior competitividade envolvendo bancos com menor tradição no financiamento de produtores rurais, pode surtir um bom efeito.

O crescimento do setor ainda é dependente da oferta de crédito subsidiado pelo governo, especialmente aos produtores de pequeno porte e com recursos mais escassos. A medida também deve interferir, em parte, na vantagem competitiva que as cooperativas tinham de acessar linhas de crédito rural para repassar para os seus cooperados. Embora os distribuidores de insumos não vão ter a prerrogativa de captar linhas de crédito rural para as suas tesourarias, terão pelo menos a oportunidade de oferecer o serviço para os seus clientes e condições similares. No final do dia, os produtores ganham uma fonte alternativa de captação de recursos. Em um horizonte de 2 safras, já teremos condições de avaliar a efetividade dessa medida.

Com a possibilidade de contratação do agente, o Banco Central mostra-se atento às necessidades do campo e abre um novo leque de alternativas à oferta de crédito, facilitando a vida não somente das instituições financeiras, mas também, e principalmente, daquele que deve ser o principal beneficiário do crédito rural: o produtor rural.

 

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