Protagonismo do amicus curiae no novo CPC

Protagonismo do amicus curiae no novo CPC

Protagonismo do amicus curiae no novo CPC

 

O novo Código de Processo Civil consagra, com expressa e inovadora previsão na lei processual, o reconhecimento à figura do amicus curiae no Direito Brasileiro, bem como a relevância de sua atuação nos litígios que envolvam interesses supraindividuais.

O “Amigo da Corte”, em tradução literal, se trata da pessoa – natural ou jurídica – que, desde que apta a contribuir à melhor solução do litígio, pode ser admitida ou até ter sua participação solicitada pelo juiz ou relator, a depender, ainda, da relevância da matéria, da complexidade envolvida, ou da repercussão social da questão com a qual se depara o órgão jurisdicional.

Apesar de não se tratar propriamente de previsão inédita no Direito Brasileiro, visto já ter sido objeto de legislações específicas, a intenção do legislador ao prever o amicus curiae no novo CPC pode ser significativa ao processo civil brasileiro. Diz-se pode, pois isto dependerá invariavelmente da convicção do juiz ou do relator, responsável pela decisão irrecorrível que admitirá, ou não, a participação da figura processual. A lei confere ao magistrado total ingerência sobre a possibilidade de participação do amicus: ele avaliará se a representatividade da pessoa ou entidade estranha ao litígio deve ser considerada adequada e definirá os poderes de atuação do amicus curiae. Este último ponto pode gerar insegurança jurídica, ao menos até maiores definições pelos Tribunais Superiores. Mais adequado seria o legislador ter estabelecido tais parâmetros.

Fato é que os Tribunais Superiores admitem há certo tempo a participação de amicus curiae em seus processos. Não é por acaso, visto que a figura, de origem compartilhada pelos Direitos Romano e Inglês, alçou nos Estados Unidos uma notoriedade de relevância incontroversa. Nesse país, é corriqueira a presença de mais de uma centena de amici em um só litígio, tendo a figura uma importância que se sobressai a de mero “Amigo da Corte”, existindo precedentes em que o amicus chegou a ser autorizado a produzir provas. Há, ainda, estudos recentes que indicam, empiricamente, que as decisões da Suprema Corte Norte-Americana têm sistematicamente incorporado argumentos apresentados pelos amici curiae, o que teria representado melhora na qualidade das decisões da referida Corte, afetando positivamente a prestação jurisdicional.

E o ponto é justamente esse. O jurisdicionado no Brasil – com destaque às empresas, em regra partes das questões mais complexas levadas ao Judiciário – invariavelmente se depara com decisões que poderiam ser mais bem construídas. Seja pelo excesso de processos ou pela cada vez maior complexidade das demandas, a qualidade das decisões poderia ser positivamente afetada pela criação de uma cultura jurisdicional na qual se admita a contribuição do amicus curiae.

Além de municiar o julgador com os mais variados aspectos que integram a demanda, o amicus curiae, apesar de não litigar na defesa de interesses próprios, possui interesse jurídico na tese discutida, podendo contribuir para o aperfeiçoamento do exercício jurisdicional e, com isso, otimizar a solução a ser encontrada em cada caso.

O instituto, do ponto de vista das empresas, que reiteradamente ocupam posições dentre os maiores litigantes do país, deve ser tratado com importância pelos departamentos jurídicos, visto que a atuação como amicus curiae faz surgir a possibilidade de participação na discussão de determinada tese jurídica, sem que se incida nos riscos (e nos custos) do litígio. Tal importância é enfatizada quando se trata de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, inédito instituto processual que objetiva proporcionar, com maior agilidade e efetividade, a uniformização do entendimento acerca de determinadas questões de direito. No referido incidente, o amicus curiae é extraordinária e expressamente autorizado a recorrer da decisão que julga-lo, permissivo que representa exceção à vedação à interposição de recursos, praxe nos demais litígios, ressalva feita aos embargos de declaração.

Pode-se considerar, portanto, que o legislador tomou um importante primeiro passo em prol da participação do amicus curiae no processo brasileiro, o que se destaca ante a permissão para a interposição de recursos no Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, grande aposta do novo diploma processual para desafogar os sobrecarregados tribunais brasileiros. O próximo passo deve ser dado pelos advogados e, com ainda maior esforço, pelos magistrados, visto que o que advogado tem a obrigação ética e profissional de demonstrar a adequação da representação que exerce, cabendo ao magistrado avalia-la. Às empresas, cabe a percepção do inédito caminho ofertado pelo legislador, que busca no novo CPC, acertadamente, uma maior colaboração das partes com o Judiciário, para que enfim seja possível o oferecimento de uma prestação jurisdicional mais adequada.

 

Erik Oioli e José Afonso Leirião Filho são advogados do Vaz, Barreto, Shingaki & Oioli Advogados