TJGO RECONHECE A VALIDADE DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL RURAL INSTITUÍDA EM FAVOR DE EMPRESA ESTRANGEIRA PARA FINS DE EXCLUIR O CRÉDITO GARANTIDO DOS EFETOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

TJGO RECONHECE A VALIDADE DA ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL RURAL INSTITUÍDA EM FAVOR DE EMPRESA ESTRANGEIRA PARA FINS DE EXCLUIR O CRÉDITO GARANTIDO DOS EFETOS DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL

Através de acórdão recente, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás reconheceu a validade de cláusula contratual que instituiu a alienação fiduciária de imóvel rural em favor de empresa estrangeira, para os fins de excluir os créditos garantidos dos efeitos da recuperação judicial da devedora fiduciante.

Ao fundamentar o voto proferido em sede de agravo de instrumento[1], o Desembargador Carlos Alberto França admitiu que a aquisição de imóveis rurais por empresas estrangeiras deve observar limitações impostas pela legislação para os adquirentes estrangeiros mas, no entanto, ressaltou que não se pode equiparar os institutos da alienação fiduciária em garantia e da efetiva compra e venda. Sendo assim, entendeu que “a alienação fiduciária de bem imóvel rural em garantia em favor de pessoa física ou jurídica estrangeira, ou a esta equiparada, não se submete às restrições estabelecidas pela Lei n. 5.709/1971. Todavia, os requisitos nela previstos devem ser observados em caso de consolidação da propriedade no patrimônio dessas pessoas, em caso de inadimplemento da obrigação garantida e de consequente excussão do bem, ou para dação do direito eventual do fiduciante em pagamento da divida garantida”. Citou ainda que a “Lei n. 6634/1979, alterada pela Lei n. 13097/15, prevê, em seu §4º, artigo 2º, a possibilidade de constituição de direito real de garantia em favor de instituição financeira, bem como a de recebimento de imóvel em liquidação de empréstimo, inclusive nos imóveis situados na faixa de fronteira”. Ainda na mesma decisão, mesmo negando a possibilidade da consolidação e registro definitivo da propriedade, acatou a possibilidade de execução dos contratos garantidos, sendo que considerou, ainda, que o bem alienado fiduciariamente poderia ser penhorado e levado à hasta pública para pagamento da dívida assumida em favor da Amerra. Assim, reformou a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau, declarou a validade da cláusula que instituiu a dita alienação fiduciária e ordenou que os correlatos créditos fossem excluídos dos efeitos da ação de recuperação judicial requerida pela Usina Goianésia.

 Destacamos que o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás andou bem ao proferir a decisão acima comentada, na medida em que, de fato, não existe qualquer impedimento legal para que um imóvel rural seja alienado fiduciariamente em favor de empresa estrangeira. Ademais, ressalta-se que a consolidação da propriedade e o posterior registro, em definitivo, do bem imóvel alienado fiduciariamente é apenas uma das hipóteses de satisfação do credor em razão do inadimplemento das obrigações garantidas. A regra, nesses casos, é a realização de leilão para a venda do imóvel alienado fiduciariamente em caso de default, sendo assim, na hipótese de efetivação dessa venda, o credor fiduciário não figuraria, necessariamente, como proprietário. É correto afirmar, então, que o registro em definitivo da propriedade plena em favor do credor fiduciário somente se daria na hipótese da ausência de interessados no dito leilão, o que não se pode prever e/ou assumir quando da constituição e registro da garantia. Por essas e por outras razões, analisadas ou não no citado acórdão, há de se preservar o instituto da alienação fiduciária, incluindo as suas benesses em relação ao processo de recuperação judicial, como forma de conferir segurança e, consequentemente, atrair o investimento estrangeiro nas atividades de financiamento do agronegócio brasileiro, sendo que essa decisão, se confirmada pelos órgãos julgadores superiores ou adotada pelos seus pares e pelos juízes de primeira instância, poderá auxiliar nessa árdua tarefa.

Apesar dos sólidos argumentos jurídicos em favor da possibilidade de constituição de alienação fiduciária, devemos alertar que esta interpretação ainda pode ter dificuldades práticas em decorrência de entendimentos divergentes adotados pelos tabeliões e registradores. Além disso, ainda não há um entendimento definitivo e vinculante sobre o tema no judiciário, motivo pelo qual a insegurança jurídica e incerteza na constituição de alienação fiduciária de bens imóveis por estrangeiros e/ou por empresas estrangeiras com controle externo permanece.

 

[1] Acórdão unânime proferido no Agravo de Instrumento de n­. 5166595.48.2018.8.09.0000, em trâmite perante a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, interposto pela Amerra Agri Fund II, LP contra decisão proferida pelo juízo da comarca de Goianésia/GO, que excluiu os créditos dessa empresa estrangeira da ação de recuperação judicial deferida em favor da Usina Goianésia S/A. Esse juízo de primeiro grau entendeu que a Amerra, por ter capital estrangeiro, não poderia adquirir imóveis rurais no Brasil e, por consequência, também estaria impossibilitada de figurar como credora fiduciária.

 

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