CVM Altera regras de regitro de emissores

A Comissão de Valores Mobiliários – CVM alterou as regras sobre o registro de emissores de valores mobiliários admitidos à negociação em mercados regulamentados.  As modificações propostas visam à incorporação de práticas de governança coorporativa previstas no Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas à regulação normativa da Autarquia.

 

Código Brasileiro de Governança Corporativa

O Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas, lançado em 16 de novembro de 2016, foi produzido pelo Grupo de Trabalho Interagentes, que é coordenado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa e formado por algumas das mais importantes entidades relacionadas ao mercado de capitais.

Apresentando princípios, fundamentos e práticas recomendadas, o modelo do Código segue a abordagem “aplique ou explique”[1].  Esse sistema reconhece que a prática da governança corporativa deve levar em consideração as características particulares de cada empresa e, por esse motivo, concede às companhias flexibilidade para explicar a eventual não adoção de determinada prática.

Assim, sob o abrigo dessa abordagem, o Código versa sobre questões chaves da governança coorporativa, refletindo práticas que devem ser adotadas pelos emissores com a finalidade de ampliar a proteção e a confiança dos investidores e, sobretudo, de fortalecer o instituto da governança corporativa no País.

 

Novidades da Nova Regra

A Instrução CVM n.º 586/17, que introduziu as novas modificações, trouxe importantes novidades à regra de registro de emissores de valores mobiliários, especialmente no tocante à incorporação do dever das companhias de divulgar informações sobre a aplicação das práticas de governança previstas no Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas.  Nesse sentido, as principais alterações promovidas pelo novo normativo da Autarquia foram:

 

I – Informe sobre o Código Brasileiro de Governanças Corporativa

Com a finalidade de efetivar a obrigação de divulgar informações sobre a aplicação das práticas de governança previstas no Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas, foi instituído pela Instrução, na forma de um novo anexo à Instrução CVM n.º 480/09, o Informe sobre o Código Brasileiro de Governança Corporativa.

Neste novo informe, os emissores deverão elaborar comentários sobre a adoção das diretrizes propostas pelo Código, comparando suas práticas de governança com as recomendações desse documento e apresentando as razões que justificam sua não adoção[2].  O propósito é garantir o disclosure necessário para que investidores e outras partes interessadas tenham acesso a esses comentários.

A entrega do documento à Autarquia deverá ser realizada, nos termos da nova Instrução, em até 7 (sete) meses contados da data de encerramento do exercício social por emissores registrados na categoria A cujas ações ou certificados de depósito de ações em bolsa de valores sejam admitidos à negociação em bolsas de valores.

Por esse motivo, é importante que os emissores se atentem aos 2 (dois) prazos definidos pela Instrução para a adequação a essa nova regra: (i) até 1 de janeiro de 2018, para emissores que, em 8 de junho de 2017, tenham ao menos uma espécie ou classe de ação de sua emissão compreendida no Índice Brasil 100 – IBrX-100 ou Índice Bovespa – IBOVESPA; e (ii) até 1 de janeiro de 2019, para demais emissores registrados na categoria A autorizados por entidade administradora de mercado à negociação de ações em bolsa de valores.

 

II – Informações Periódicas

Dentre as informações periódicas que devem ser enviadas pelos emissores à CVM, previstas no art. 21 da Instrução CVM n.º 480/09[3], foram incluídos (i) o informe supramencionado, sobre o Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas; (ii) mapas sintéticos de votação relativos à assembleia geral ordinária; e (iii) relatório elaborado pelo agente fiduciário de certificados de recebíveis imobiliários, se aplicável.

A nova exigência do envio de mapas sintéticos de votação caminha ao encontro do princípio, postulado pelo Código, de que “cada ação deve dar direito a um voto”.  Sob o fundamento de que estruturas acionárias aderentes a esse princípio promovem o alinhamento de interesses entre todos os acionistas, o Código recomenda que o capital social da companhia seja composto apenas por ações ordinárias, de modo a fazer com que o poder político, representado pelo direito de voto, seja proporcional aos direitos econômicos atribuídos às ações.

 

III – Formulário de Referência

Às hipóteses de atualização eventual do Formulário de Referência[4], foram acrescidos casos de alteração de membro de comitê estatutário ou de membro dos comitês de auditoria, de risco, financeiro e de remuneração que participem do processo de decisão dos órgãos de administração ou de gestão do emissor como consultores ou fiscais.

Essa alteração é um reflexo da importância atribuída pelo Código aos órgãos de fiscalização e controle, especialmente em razão do princípio de que “a companhia deve ter um comitê de auditoria estatutário, independente e qualificado”.  Sob o fundamento de que o comitê de auditoria é um órgão de assessoramento relevante, o Código recomenda que, dentre suas atribuições, esteja a de assessorar o conselho de administração no monitoramento e controle da qualidade das demonstrações financeiras, nos controles internos, no gerenciamento de riscos e compliance.

Além disso, à Instrução CVM n.º 480/09 foi adicionada a previsão de que caso ocorra a alteração do presidente ou do diretor de relações com investidores de emissores após a entrega do Formulário de Referência, o novo ocupante do cargo ficará responsável pela atualização das informações desse documento.

 

IV – Demonstrações Financeiras

Foram incluídos, dentre os documentos previstos no art. 25, §1º, da Instrução CVM n.º 480/09[5], que devem acompanhar as demonstrações financeiras entregues à CVM:

  • declarações dos diretores responsáveis por fazer elaborar as demonstrações financeiras no sentido de que reviram, discutiram e concordam com as demonstrações financeiras e com as opiniões expressas no parecer dos auditores independentes;
  • relatório anual resumido, caso o emissor adote o comitê de auditoria estatutário;
  • em se tratando de securitizadora, demonstrações financeiras relativas a cada um dos patrimônios separados, por emissão de certificados de recebíveis em regime fiduciário; e
  • se houver, parecer ou relatório de comitê de auditoria que trate das demonstrações financeiras, ainda que tal comitê não seja estatutário.

 

Essa inclusão se justifica, sobretudo, a partir de dois fundamentos adotados pelo Código: o primeiro, de que cabe à Diretoria implementar mecanismos, processos e controles que visem a assegurar a observância aos limites de risco; e o segundo, de que o comitê de auditoria é um órgão relevante de assessoramento ao Conselho de Administração, para auxiliá-lo no monitoramento e controle da qualidade das demonstrações financeiras.

 

V – Formulário de Informações Trimestrais (ITR)

A partir de edição da Instrução CVM n.º 586/17, o Formulário de Informações Trimestrais (ITR) deverá ser acompanhado também, além do relatório de revisão especial previsto no art. 29, §1º, da Instrução CVM n.º 480/09[6], de declaração dos diretores no sentido de que reviram, discutiram e concordam com as demonstrações financeiras e com as opiniões expressas no relatório dos auditores independentes.

Assim como nas mudanças propostas nas Demonstrações Financeiras, a alteração se apoia sobre o fundamento de que cabe à Diretoria implementar mecanismos, processos e controles que visem a assegurar a observância aos limites de risco.  Do mesmo modo, essa modificação visa a atribuir confiabilidade às informações prestadas pelas companhias.

 

Breves Considerações

O tema da Governança Corporativa é contemporâneo em matéria de Direito Societário e de Mercado de Capitais.  Por meio da incorporação de práticas do recém-divulgado Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas, a edição da Instrução CVM n.º 586/17 corresponde a um reflexo dos recentes movimentos admitidos pelas entidades internacionais no sentido de posicionar a adoção de tais práticas sob a supervisão do regulador.

Seguindo essa diretriz, a adoção da abordagem “aplique ou explique” e a criação do Informe sobre o Código Brasileiro de Governança Corporativa apresentam-se como medidas adequadas na evolução do estímulo à adoção de práticas de governança corporativa pelas companhias abertas.  Sem onerá-las com obrigações descabidas, essas medidas garantem o acesso a informações indispensáveis à formação da decisão de investimento, possibilitando ainda que seja explicada a eventual não adoção de determinada prática.

Diante deste cenário, a edição da nova Instrução, antes mesmo de promover a incorporação dessas práticas ao direito positivo, trouxe como principal contribuição, em matéria de Governança Corporativa, uma oportunidade até então pouco difundida entre as companhias abertas: a de propiciar uma importante reflexão sobre seus sistemas de governança e de avaliação de suas práticas.

O escritório Vaz, Barreto, Shingaki e Oioli Advogados está à disposição para esclarecer dúvidas e assessorá-los neste e em outros assuntos.

 

Equipe de Mercado de Capitais – VBSO Advogados

[1] O propósito do modelo “aplique ou explique” é permitir que o mercado decida se as práticas adotadas por determinada companhia são adequadas em vista dos padrões de governança do Código, do estágio de desenvolvimento da companhia e das explicações fornecidas.

[2] Para evitar duplicidade de prestação de informações, o informe prevê expressamente que, ao elaborar seus comentários, a companhia pode fazer remissão a informações existentes no Formulário de Referência.

[3] Art. 21 O emissor deve enviar à CVM por meio de sistema eletrônico disponível na página da CVM na rede mundial de computadores, as seguintes informações periódicas: (…)

[4] Art. 24. O formulário de referência é documento eletrônico cujo conteúdo reflete o Anexo 24. (…)

  • 3º O emissor registrado na categoria A deve atualizar os campos correspondentes do formulário de referência, em até 7 (sete) dias úteis contados da ocorrência de qualquer dos seguintes fatos: (…)

[5] Art. 25. O emissor deve entregar as demonstrações financeiras à CVM na data em que forem colocadas à disposição do público. (…)

  • 1º As demonstrações financeiras devem ser acompanhadas de: (…)

[6] Art. 29. O formulário de informações trimestrais – ITR é documento eletrônico que deve ser: (…)

  • 1º O formulário de informações trimestrais – ITR deve ser acompanhado de relatório de revisão especial, emitido por auditor independente registrado na CVM.