Panorama geral do Programa Especial de Regularização Tributária (PERT)

1. Introdução

Não é novidade que o sistema tributário brasileiro é complexo e gera inúmeras discussões administrativas e judiciais. Esse cenário é amplificado em momentos de crise econômica, quando as empresas têm maior dificuldade em arcar com os ônus que lhe são impostos.

O aumento dos litígios tributários, por sua vez, atinge diretamente o Poder Público, que tem sua receita diminuída pela falta de arrecadação imediata dos tributos.

Em uma tentativa de reduzir os problemas de ambas as partes, o Poder Público tem proporcionado aos contribuintes programas de regularização dos débitos tributários, nos quais o contribuinte desiste da discussão em troca de condições mais favoráveis de quitação (parcelamentos, descontos, dentre outros).

O mais recente destes programas é o Programa Especial de Regularização Tributária (“PERT”), instituído pela Medida Provisória nº 783/2017. Na exposição de motivos do PERT, assinada pelo atual Ministro da Fazenda Henrique Meirelles, está expressa sua finalidade: “a proposta justifica-se pela necessidade de proporcionar às empresas condições de enfrentarem a crise econômica atual por que passa o País, permitindo que voltem a gerar renda e empregos e a arrecadar seus tributos.

O PERT abrange débitos junto à Receita Federal do Brasil (“RFB”) e à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (“PGFN”), tributários e não tributários, inscritos ou não em dívida ativa, vencidos até 30 de abril de 2017, mesmo os que já tiverem sido objeto de parcelamentos anteriores. Não há obrigatoriedade de inclusão de todos os débitos exigíveis no programa.

Ao aderir, o contribuinte deve levar em conta o fato de que a adesão ao PERT implica:

(i) a confissão irrevogável e irretratável dos débitos objeto de adesão;

(ii) a aceitação de todas as condições previstas na Medida Provisória nº 783/2017 e nas suas normas regulamentadoras;

(iii) o dever de pagar regularmente as parcelas do PERT;

(iv) o dever de pagar débitos vencidos após 30 de abril de 2017 (o que significa que o aderente não poderá ter débitos em atraso enquanto vigente o PERT);

(v) a vedação da inclusão dos débitos que compõem o PERT em qualquer outra forma de parcelamento posterior (exceto o reparcelamento ordinário);

(vi) a manutenção dos gravames decorrentes de arrolamento de bens, de medida cautelar fiscal e das garantias prestadas administrativamente, nas ações de execução fiscal ou em qualquer outra ação judicial;

(vii) o dever de acessar periodicamente o e-CAC PGFN para acompanhamento da situação do parcelamento e emissão do Darf para pagamento do valor à vista e das parcelas;

(viii) a adesão ao Domicílio Tributário Eletrônico (“DTE”);e

(ix) a exigência de regular cumprimento das obrigações com o FGTS.

Em relação aos débitos junto à RFB, a adesão ao PERT deve ocorrer entre 3 de julho e 31 de agosto de 2017 por meio do site da RFB. Com relação aos débitos junto à PGFN, a adesão deve ser feita entre 1º e 31 de agosto de 2017.

 

2. Modalidades de adesão

 

Há diferentes modalidades de adesão ao PERT para os débitos de competência da RFB e para os de competência da PGFN, que estão resumidas nos quadros abaixo.

 

Modalidades de quitação/parcelamento perante a perante a RFB
Modalidade 1: pagamento em espécie + utilização de créditos tributários + parcelamento do saldo remanescente  

Passo 1: Pagamento à vista e em espécie de, no mínimo, 20% do valor da dívida consolidada, sem reduções, em 5 parcelas mensais e sucessivas, vencíveis de agosto a dezembro de 2017;

 

Passo 2: liquidação do restante com a utilização de créditos de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL ou com outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil; e

 

Passo 3: havendo saldo remanescente após os passos 1 e 2, pagamento, em espécie, em até 60 prestações adicionais, vencíveis a partir do mês seguinte ao do pagamento à vista.

Modalidade 2: parcelamento em até 120 prestações crescentes  

Pagamento da dívida consolidada em até 120 prestações mensais e sucessivas, calculadas de modo a observar os seguintes percentuais mínimos, aplicados sobre o valor da dívida consolidada:

 

a)     1ª a 12ª prestação: 0,4%;

 

b)    da 13ª à 24ª prestação: 0,5%

 

c)     da 25ª à 36ª prestação: 0,6%; e

 

d)    da 37ª prestação em diante: saldo remanescente dividido em até 84 prestações mensais e sucessivas.

Modalidades 3, 4 e 5: pagamento em espécie + parcelamento com reduções de multa e juros  

Pagamento à vista e em espécie de, no mínimo, 20% do valor da dívida consolidada, sem reduções, em 5 parcelas mensais e sucessivas, vencíveis de agosto a dezembro de 2017, e o restante:

 

a)             liquidado integralmente em janeiro de 2018, em parcela única, com redução de 90% dos juros de mora e 50% das multas de mora, de ofício ou isoladas;

 

b)             parcelado em até 145 parcelas mensais e sucessivas, vencíveis a partir de janeiro de 2018, com redução de 80% dos juros de mora e de 40% das multas de mora, de ofício ou isoladas; ou

 

c)             parcelado em até 175 parcelas mensais e sucessivas, vencíveis a partir de janeiro de 2018, com redução de 50% dos juros de mora e de 25% das multas de mora, de ofício ou isoladas, sendo cada parcela calculada com base no valor correspondente a 1% da receita bruta da pessoa jurídica, referente ao mês imediatamente anterior ao do pagamento, não podendo ser inferior a 1/175 do total da dívida consolidada.

Modalidade especial (condições diferenciadas para as modalidades 3, 4 ou 5 para os devedores com dívida total, sem reduções, igual ou inferior a R$ 15.000.000,00)  

1ª condição diferenciada: redução do pagamento à vista e em espécie para, no mínimo, 7,5% do valor da dívida consolidada, sem reduções, em 5 parcelas mensais e sucessivas, vencíveis de agosto a dezembro de 2017; e

 

2ª condição diferenciada: após a aplicação das reduções de multas e juros, a possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL e de outros créditos próprios relativos aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, com a liquidação do saldo remanescente, em espécie, pelo número de parcelas previstas para a modalidade.

Os créditos de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL a serem utilizados na modalidade 1 e na modalidade especial são aqueles apurados até 31 de dezembro de 2015 e declarados até 29 de julho de 2016, que sejam:

(i) próprios;
(ii) do responsável tributário ou corresponsável pelo débito; e
(iii) de empresas controladora e controlada, de forma direta ou indireta, ou de empresas que sejam controladas direta ou indiretamente por uma mesma empresa, em 31 de dezembro de 2015, domiciliadas no País, desde que se mantenham nesta condição até a data da opção pela quitação.

 

O valor do crédito é obtido mediante a aplicação das alíquotas de IRPJ e CSLL a que está sujeito o devedor, conforme indicado abaixo:

Determinação dos créditos de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL
Tipo de sujeito passivo % do prejuízo fiscal (IRPJ) % da base de cálculo negativa da CSLL
Pessoas jurídicas em geral 25% 9%
Cooperativas de crédito 25% 17%
Demais instituições financeiras 25% 20%

Com relação aos débitos junto à PGFN, as modalidades de pagamento são as seguintes:

 

Modalidades de quitação/parcelamento perante a PGFN
Modalidade 1: parcelamento em até 120 prestações crescentes  

Pagamento da dívida consolidada em até 120 prestações mensais e sucessivas, calculadas de modo a observar os seguintes percentuais mínimos, aplicados sobre o valor da dívida consolidada:

 

a)     1ª a 12ª prestação: 0,4%;

 

b)    da 13ª à 24ª prestação: 0,5%

 

c)     da 25ª à 36ª prestação: 0,6%; e

 

d)    da 37ª prestação em diante: saldo remanescente dividido em até 84 prestações mensais e sucessivas.

Modalidades 2, 3 e 4: pagamento em espécie + parcelamento com reduções de multa e juros  

Pagamento à vista e em espécie de, no mínimo, 20% do valor da dívida consolidada, sem reduções, em 5  parcelas mensais e sucessivas, vencíveis de agosto a dezembro de 2017, e o restante:

 

a)     liquidado integralmente em janeiro de 2018, em parcela única, com redução de 90% dos juros de mora, de 50% das multas de mora, de ofício ou isoladas, e de 25% dos encargos legais;

 

b)    parcelado em até 145 parcelas mensais e sucessivas, vencíveis a partir de janeiro de 2018, com redução de 80% dos juros de mora, de 40% das multas de mora, de ofício ou isoladas, e de 25% dos encargos legais; ou

 

c)     parcelado em até 175 parcelas mensais e sucessivas, vencíveis a partir de janeiro de 2018, com redução de 50% dos juros de mora e de 25% das multas de mora, de ofício ou isoladas, e de 25% dos encargos legais, sendo cada parcela calculada com base no valor correspondente a 1% cento da receita bruta da pessoa jurídica, referente ao mês imediatamente anterior ao do pagamento, não podendo ser inferior a 1/175 do total da dívida consolidada.

Modalidade especial (condições diferenciadas para as modalidades 2, 3 ou 4 para os devedores com dívida total, sem reduções, igual ou inferior a R$ 15.000.000,00 1ª condição diferenciada: redução do pagamento à vista e em espécie para, no mínimo, 7,5% do valor da dívida consolidada, sem reduções, em 5 parcelas mensais e sucessivas, vencíveis de agosto a dezembro de 2017; e

 

2ª condição diferenciada: após a aplicação das reduções de multas e juros, a possibilidade de oferecimento de dação em pagamento de bens imóveis, desde que previamente aceita pela União, para quitação do saldo remanescente.

 

Cabe notar que não há possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal, base de cálculo da CSLL ou outros créditos para os débitos de competência da PGFN.

 

Em relação aos débitos perante a PGFN, deve ser feita uma adesão cada tipo de débito: (i) contribuições previdenciárias (exceto as recolhidas por DARF); (ii) contribuições sociais instituídas pela Lei Complementar 110/2001; e (iii) demais débitos administrados pela PGFN (incluindo as contribuições previdenciárias recolhidas por DARF).

 

III.Limitações ao PERT

 

Além da restrição a débitos vencidos após 30 de abril de 2017, a Instrução Normativa RFB nº 1.711/2017 e a Portaria PGFN nº 690/2017, responsáveis por regulamentar o PERT nos âmbitos da RFB e da PGFN, respectivamente, trazem lista dos débitos que não poderão ser incluídos no PERT:

(i) débitos do SIMPLES;

(ii) débitos provenientes de tributos passíveis de retenção na fonte, de desconto de terceiros ou de sub-rogação;

(iii) débitos de pessoa jurídica com falência decretada;

(iv) débitos de pessoa física com insolvência civil decretada;

(v) débitos de incorporadoras optantes pelo regime especial tributário do patrimônio de afetação; e

(vi) débitos constituídos mediante lançamento de ofício efetuado em decorrência da constatação da prática de crime de sonegação, fraude ou conluio.

Com relação à vedação prevista no item “vi”, a Instrução Normativa nº 1.711/2017 e a Portaria nº 690/2017 trazem hipótese distinta daquela prevista na Medida Provisória nº 783/2017, que exige que o lançamento de ofício referente a débito com alegação de fraude, sonegação ou conluio já tenha sido definitivamente julgado no âmbito administrativo.

A inovação trazida na Instrução Normativa nº 1.711/2017 e na Portaria nº 690/2017 é questionável e dá sinais de que o contribuinte deve se atentar para eventuais divergências entre o disposto na Medida Provisória e na regulamentação do PERT, acompanhando a evolução das discussões antes de aderir ao programa.

IV. Exclusão do PERT

Por fim, é importante ressaltar que são causas de exclusão do PERT:

(i) a falta de pagamento de 3 parcelas consecutivas ou 6 alternadas;

(ii) a falta de pagamento de uma parcela, se todas as demais estiverem pagas;

(iii) a constatação, pela RFB ou pela PGFN, de qualquer ato tendente ao esvaziamento patrimonial do sujeito passivo, como forma de fraudar o cumprimento do parcelamento;

(iv) a decretação de falência ou extinção, pela liquidação, da pessoa jurídica optante;

(v) a concessão de medida cautelar fiscal, em desfavor da pessoa optante;

(vi) a declaração de inaptidão do CNPJ; e

(vii) a não manutenção da regularidade fiscal.

Caso ocorra a exclusão, será apurado o valor original do débito, com acréscimos legais, até a data da rescisão. Deste valor serão deduzidas as parcelas pagas em espécie, com acréscimos legais até a data da rescisão. Os valores que tenham sido liquidados com créditos serão reestabelecidos em cobrança.

Importante ressaltar que, conforme a Portaria PFGN 690/2017, uma parcela com pagamento parcial será considerada como não paga.

V. Conclusão

 

Em linha com o objetivo de reduzir o número de litígios e aumentar a arrecadação tributária, o PERT pode vir a ser um mecanismo que efetivamente concilie os interesses dos contribuintes e do Poder Público.

Ainda estando pendente a conversão ou não da Medida Provisória nº 783/2017 em lei (cujo prazo é posterior ao prazo de adesão), o contribuinte deve acompanhar a evolução do PERT e avaliar cuidadosamente os benefícios e as consequências da adesão antes de qualquer iniciativa.