Valor Econômico – Após consulta pública cripto advogados falam em reguladores mais ‘maduros’

Valor Econômico – Após consulta pública cripto advogados falam em reguladores mais ‘maduros’

O Banco Central (BC) publicou ontem uma consulta pública pedindo sugestões da sociedade para a regulamentação dos criptoativos que irá lançar no ano que vem. Nas 38 questões propostas, o BC foi a fundo em temas como a maneira pela qual as corretoras devem segregar seus ativos daqueles que custodia para os clientes, como armazenar criptomoedas e que tipo de medidas devem ser tomadas em termos de prevenção à lavagem de dinheiro (PLD) e combate ao financiamento do terrorismo (FT). Para advogados, a consulta demonstrou bastante conhecimento das autoridades e traz uma sinalização positiva para o mercado de ativos digitais brasileiro.

Segundo Nicole Dyskant, advogada especialista em criptoativos e conselheira da Fireblocks, a consulta pública mostrou que o regulador brasileiro amadureceu no entendimento sobre os ativos digitais. “Fica público o que a indústria mais atuante já sabia: o time do BC estudou a fundo o tema e colocou de forma cirúrgica para contribuição da sociedade os pontos mais relevantes do setor, como segregação patrimonial, custódia, travel rule, PLD/FT, dentre outros”, afirma. A travel rule é uma norma que foi adotada em Gibraltar e obriga as instituições a não só compartilhar informações sobre seus clientes, mas também sobre a pessoa para quem estão enviando dinheiro ou de quem estão recebendo recursos.

Já Erik Oioli, especialista em ativos digitais do VBSO Advogados, diz que as perguntas colocadas dão uma visão das preocupações do regulador.

“Trata-se uma estratégia regulatória interessante, que demonstra uma sensibilidade em lidar com um tema tão complexo e com muitas nuances, buscando garantir assertividade na construção das futuras regras que enderecem de forma efetiva suas preocupações e ao mesmo tempo respeitem dinâmicas de mercado e o aproveitamento de oportunidades na aplicação de novas tecnologias”, afirma.

Yuri Nabeshima, head da área de Inovação do VBD Advogados, destaca que o ponto da segregação patrimonial foi objeto de diversos debates na esfera legislativa, lembrando que o item chegou a ser incluído pelo Senado no Marco dos Criptoativos, mas depois caiu durante a tramitação na Câmara. Ao final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Pirâmides de Criptoativos, os deputados sugeriram que a segregação de ativos é necessária para garantir maior segurança aos investidores. Além disso, alguns senadores como Soraya Thornicke (Pode-MS) já possuem projetos de lei para estabelecer a obrigatoriedade de separar patrimônio de exchange e cliente.

Eduardo Bruzzi, sócio do BBL Advogados, acredita que a segregação patrimonial poderá proporcionar um aumento da confiança geral no mercado, atraindo mais investidores aos criptoativos. Para Bruzzi, a Lei nº 13.865/2013, que regulamenta o mercado de pagamentos, pode ser uma boa inspiração para a segregação em criptomoedas, já que permite a que as instituições garantam a liquidez de suas operações ao manter como garantia uma quantidade de ativos correspondente em contas no próprio BC ou investidas em títulos públicos. “Esses recursos estariam protegidos nas hipóteses de eventuais recuperações judiciais e decretações de falência”, explica.

Em relação às questões envolvendo gestão de risco e conduta, Yuri diz que são pontos também muito relevantes, pois a atividade prestada pelas chamadas Vasps – as empresas que prestam serviços ligados a ativos virtuais – envolve uma série de riscos. “Questões como governança e conduta, bem como segurança cibernética, também devem ser objeto de estudo aprofundado dado o risco envolvido nas atividades das Vasps, sobretudo se não estão sediadas no Brasil, em razão da dificuldade de ingressar com medidas judiciais para defesa dos direitos dos investidores”, aponta. Hoje, algumas das maiores empresas que ofertam criptomoedas a brasileiros estão sediadas no exterior, como é o caso da Binance, maior exchange do mundo.

Por outro lado, Mirella Andreola, sócia do Machado Associados, diz que sentiu falta de alguma questão relativa ao uso de inteligência artificial no mercado de ativos digitais. “Seria aplicável no contexto? Precisaria de alguma regulamentação?”, questiona. No entanto, ela avalia que o movimento do BC em abrir para sugestões é importante para garantir que a autoridade monetária não irá regular de uma forma que iniba o mercado e o feche para as possibilidades de inovação trazidas por cripto. “É importante que o BC esteja se preocupando com isso e levando em consideração o que aparece na consulta. É um passo importante rumo a uma regulamentação sensata.

Notícia originalmente publicada no site do Valor Econômico – clique aqui para ler na íntegra.