CVM determina que a reserva especial de ágio seja considerada no valor total do patrimônio líquido para fins de cálculo do reembolso

CVM determina que a reserva especial de ágio seja considerada no valor total do patrimônio líquido para fins de cálculo do reembolso

Em recente decisão, o Colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), por unanimidade, entendeu que, para fins de cálculo do valor de reembolso aos acionistas dissidentes, a reserva de ágio não poderá ser desconsiderada do valor total do patrimônio líquido da companhia.

No caso em questão, os acionistas de determinada companhia aberta pretendiam deliberar sobre a migração da companhia para o segmento especial denominado de Novo Mercado. Tendo em vista que a adesão a este segmento requer a conversão da totalidade das ações preferenciais em ações ordinárias, eventuais acionistas dissidentes teriam direito de retirar-se da companhia e receber o reembolso do valor correspondente às suas ações.

Considerando-se que o estatuto social da companhia não dispunha a respeito do critério de determinação do valor de reembolso, a própria companhia reconhecia que o valor das ações deveria ser apurado com base no valor do patrimônio líquido constante do último balanço aprovado pela assembleia geral da sociedade, em atendimento ao previsto no §1º, do artigo 45[1], da Lei das S.A.

No entanto, a companhia defendeu em sua consulta à CVM que o valor da reserva especial de ágio não deveria ser computado no cálculo do preço de reembolso aos acionistas dissidentes, tendo em vista que referida reserva não representaria um instrumento patrimonial, mas sim um passivo da companhia, na medida em que diz respeito à entrega condicional de ações em quantidade variável ao acionista controlador[2], representando, portanto, benefício de uma parte dos acionistas.

A CVM apontou, entretanto, que as considerações da companhia relativas à qualificação da reserva especial de ágio não alteram as conclusões acerca do critério que deve ser utilizado na avaliação da companhia para fins de cálculo do reembolso, matéria que representa o objeto da consulta. No entendimento da CVM, sendo silente o estatuto social, deve ser aplicada a disposição expressa da Lei das S.A. segundo a qual o valor das ações deve ser apurado, para fins de reembolso aos acionistas, com base no valor do patrimônio líquido constante do último balanço aprovado pela assembleia geral.

Referida previsão legal não apenas constitui critério supletivo para a determinação do valor de reembolso – aplicável nos casos em que o estatuto social seja omisso – como também representa o valor mínimo a ser pago aos acionistas dissidentes, de modo que somente seria possível o estabelecimento de preço inferior ao calculado com base no patrimônio líquido contábil caso o estatuto social definisse, como critério para a apuração do reembolso, o valor econômico.

Desta forma, a companhia não pode pagar aos acionistas dissidentes valor inferior ao do patrimônio líquido constante do balanço patrimonial aprovado na última assembleia geral que deliberou sobre suas contas, uma vez tendo a lei definido critério específico para cálculo de reembolso, que não pode ser afastado.

Tendo em vista que o artigo 6º da Instrução CVM nº 319[3], de 1999, prevê expressamente que a reserva especial de ágio deve ser reconhecida no patrimônio líquido da sociedade e que, no caso da companhia, referida reserva integrava seu patrimônio líquido, conforme constante do balanço patrimonial da consulente aprovado em sua última assembleia geral ordinária, a CVM concluiu que não seria lícito o desconto de qualquer elemento integrante do patrimônio líquido da Companhia, nem mesmo do montante correspondente à reserva de ágio.

 

 

[1] Art. 45, § 1º, da Lei das S.A.: “O estatuto pode estabelecer normas para a determinação do valor de reembolso, que, entretanto, somente poderá ser inferior ao valor de patrimônio líquido constante do último balanço aprovado pela assembleia geral, observado o disposto no § 2º, se estipulado com base no valor econômico da companhia, a ser apurado em avaliação (§§ 3º e 4º).

[2] O benefício da capitalização em proveito do acionista controlador está previsto no art. 7º da Instrução CVM nº 319/1999: “O protocolo de incorporação de controladora por companhia aberta controlada poderá prever que, nos casos em que a companhia vier a auferir benefício fiscal, em decorrência da amortização do ágio referido no inciso III do art. 6º desta Instrução, a parcela da reserva especial de ágio na incorporação correspondente a tal benefício poderá ser objeto de capitalização em proveito do acionista controlador”.

[3] Art. 6º: “O montante do ágio ou do deságio, conforme o caso, resultante da aquisição do controle da companhia aberta que vier a incorporar sua controladora será contabilizado, na incorporadora, da seguinte forma: I – nas contas representativas dos bens que lhes deram origem – quando o fundamento econômico tiver sido a diferença entre o valor de mercado dos bens e o seu valor contábil (Instrução CVM nº 247/96, art. 14, § 1º); II – em conta específica do ativo imobilizado (ágio) – quando o fundamento econômico tiver sido a aquisição do direito de exploração, concessão ou permissão delegadas pelo Poder Público (Instrução CVM nº 247/96, art. 14, § 2º, alínea b); e III – em conta específica do ativo diferido (ágio) ou em conta específica de resultado de exercício futuro (deságio) – quando o fundamento econômico tiver sido a expectativa de resultado futuro (Instrução CVM nº 247/96, art. 14, § 2º, alínea a). §1º O registro do ágio referido no inciso I deste artigo terá como contrapartida reserva especial de ágio na incorporação, constante do patrimônio líquido, devendo a companhia observar, relativamente aos registros referidos nos incisos II e III, o seguinte tratamento: a) constituir provisão, na incorporada, no mínimo, no montante da diferença entre o valor do ágio e do benefício fiscal decorrente da sua amortização, que será apresentada como redução da conta em que o ágio foi registrado; b) registrar o valor líquido (ágio menos provisão) em contrapartida da conta de reserva referida neste parágrafo; c) reverter a provisão referida na letra “a” acima para o resultado do período, proporcionalmente à amortização do ágio; e d) apresentar, para fins de divulgação das demonstrações contábeis, o valor líquido referido na letra “a” no ativo circulante e/ou realizável a longo prazo, conforme a expectativa da sua realização.”