CVM propõe novas regras sobre FIAGRO

CVM propõe novas regras sobre FIAGRO

Ansiosamente aguardadas pelo mercado, as novas regras sobre a constituição e funcionamento dos fundos de investimento nas cadeias produtivas do agronegócio – FIAGRO foram colocadas em audiência pública pela CVM em 31 de outubro.

Nos termos do Edital de Audiência Pública SDM nº 03/23, a CVM sinaliza que buscou subsidiar sua proposta regulatória na experiência concreta decorrente do regime experimental decorrente da Resolução CVM nº 39, de 13 de julho de 2021.

A regra experimental determinava a aplicação das regras dos demais fundos de investimento estruturados (a saber: fundo de investimento em direitos creditórios – FIDC, fundo de investimento imobiliário – FII ou do fundo de investimento em participações – FIP) aos FIAGRO, conforme a política de investimento desejada. No entanto, proibia a constituição de um FIAGRO cuja política de investimento transitasse entre diversas categorias de ativos.

De modo inovador, a regra proposta remove essa barreira, permitindo que sejam constituídos FIAGRO que adquiram quaisquer dos ativos incluídos no artigo 20-A da Lei nº 8.668/94, criando uma espécie de FIAGRO “multimercado” que perpasse todos os possíveis espectros de investimento no agronegócio.

O FIAGRO será considerado “multimercado” apenas caso não concentre mais de 1/3 do seu patrimônio em ativos passíveis de aquisição por apenas um dos fundos estruturados.  Nesta hipótese, estará sujeito exclusivamente à parte geral da nova regra de fundos (Resolução CVM nº 175/22) e ao seu Anexo VI, incluído quando da aprovação da regra definitiva dos FIAGRO, que se baseia largamente na regra dos FII.

Por outro lado, caso haja concentração de 1/3 ou mais do patrimônio do FIAGRO em ativos que sejam objeto de investimento de outros fundos estruturados, a classe em questão ficará sujeita à aplicação subsidiária das regras do(s) fundo(s) estruturado(s) em questão.

Esta sugestão é meritória, porquanto se baseia no verdadeiro sucesso da abordagem regulatória experimental ainda em vigor e, de fato, tem como finalidade a eliminação de indesejáveis assimetrias regulatórias.

Contudo, esta regra traz consigo dois desafios. Em primeiro lugar, há uma superposição de ativos passíveis de investimento por diferentes fundos estruturados. Por exemplo, os FIDC podem adquirir debêntures, e os FII também, desde que o emissor esteja conectado ao mundo imobiliário; os FIP podem adquirir ações ou cotas de sociedades de propósito específico, assim como os FII (desde que relativos ao mundo imobiliário).

Como mitigante deste primeiro desafio, seria positivo que tais superposições fossem mapeadas para que o futuro Anexo VI da Resolução CVM nº 175/22 já apontasse claramente qual base regulatória prevalecerá em cada caso.

Em segundo lugar, a determinação da aplicação subsidiária simultânea de normas de dois diferentes fundos estruturados poderá causar dificuldades interpretativas em casos práticos.

Por exemplo: se um FIAGRO adquirir direitos creditórios em montante superior a 40% do seu patrimônio e 35% do seu patrimônio em ações de companhias fechadas, os devedores dos direitos creditórios deverão observar as regras de governança previstas no Anexo IV da regra de fundos? Caso adquira debêntures de companhias fechadas, deveremos tratar sob a égide do Anexo IV (FIP) ou Anexo II (FIDC), que preveem diferentes abordagens sobre o tema?

Notamos que a norma proposta já ataca uma possível superposição, determinando que o investimento em títulos de securitização – algo que pode ser feito pelo FII e pelo FIDC – atrairá a incidência das regras pertinentes aos fundos imobiliários (Anexo III da nova regra de fundos) e não dos fundos de recebíveis. É desejável que previsões similares sejam adicionadas à regra definitiva, lidando com os demais conflitos detectados.

De qualquer modo, ressaltamos que as observações acima devem redundar apenas em refinamentos da sistemática proposta, e não diminuem o mérito da inteligente solução proposta pelo regulador.

Por fim, o edital propõe permitir aos FIAGRO a aquisição de créditos de carbono emitidos em mercado regulado, voluntário ou compulsório, limitando o público-alvo a investidores qualificados em caso de investimento em créditos de mercado voluntário. Inovação positiva sob a ótica das finanças sustentáveis.

A CVM receberá comentários à norma até 31 de janeiro de 2024.

VBSO Advogados – Equipes de Agronegócio & Mercado Financeiro e de Capitais