STF DEMONSTRA INCLINAÇÃO RELATIVA À ANTECIPAÇÃO DA LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS

STF DEMONSTRA INCLINAÇÃO RELATIVA À ANTECIPAÇÃO DA LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS

Diversas medidas têm sido adotadas pelo governo federal como forma de mitigar os impactos decorrentes da pandemia causada pelo COVID-19 – dentre elas, a publicação da Medida Provisória nº 954, de 17 de abril de 2020, que autoriza o compartilhamento de dados por companhias de telecomunicações com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (“IBGE”) para fins de suporte à produção estatística oficial durante a situação de emergência de saúde pública atual e, conflitando, dessa forma, com disposições da Lei Geral de Proteção de Dados, de 14 de dezembro de 2018 (“LGPD”).

Ocorre que essa nova norma foi alvo de decisão do Supremo Tribunal Federal (“STF”) que aponta inclinação do órgão quanto à aplicação de obrigações disciplinadas na Lei Geral de Proteção de Dados (“LGPD”), antes da sua plena entrada em vigor.

Desde sua publicação, a Medida Provisória nº 954 já foi alvo de 5 (cinco) Ações Diretas de Inconstitucionalidade (“ADI”) propostas pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (“OAB”), e por partidos políticos diversos, como o PSDB, PSB, PSOL e PCdoB.  As ADI – que são ações especiais para questionar a constitucionalidade de normas expedidas pelos poderes – são pautadas no princípio de que as informações objeto da Medida Provisória nº 954 são amparadas pelo artigo 5º da Constituição Federal, que dispõe sobre o direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas, dentre outros.

Assim, o compartilhamento de dados pessoais de pessoas físicas, por empresas de telecomunicações prestadoras do Serviço Telefônico Fixo Comutado – STFC e do Serviço Móvel Pessoal – SMP com o IBGE fere, na ótica do STF, esses direitos fundamentais previstos no artigo 5º da Constituição Federal.

A fim de prevenir danos irreparáveis à intimidade e ao sigilo da vida privada dos usuários com base no artigo 5º da Constituição Federal, em julgamento ocorrido no dia 7 de maio de 2020, a ministra Rosa Weber concedeu medida cautelar para suspender a validade da Medida Provisória nº 954, até o fim do julgamento das ADI, o que significa que, quando da entrada em vigor da LGPD, as exceções aos seus termos, decorrentes da Medida Provisória nº 954, podem não estar em vigor, a depender do julgamento final das ADI.

Adicionalmente, o STF reconheceu que a Medida Provisória nº 954 não dispõe sobre a necessidade de mecanismos que assegurem o sigilo dos dados compartilhados, obrigação esta prevista na LGPD, em seu capítulo VII, somando esta discrepância à violação constitucional declarada pelo STF.

Em que pese a decisão do STF, as disposições da LGPD ainda estão sob os efeitos da Medida Provisória nº 959, de 29 de abril de 2020, a qual prorrogou a vigência da LGPD como um todo, medida a qual não foi objeto de ADI até o momento, permanecendo em vigor nesta data.

Porém, cabe ressaltar que a Medida Provisória nº 959 ainda não foi analisada pelo Congresso Nacional e possui vigência de 60 dias prorrogáveis por igual período, dispondo, portanto, de 120 dias de vigência máxima.  Em outras palavras, em caso de prorrogação, a norma poderá ficar vigente apenas até 27 de agosto deste ano.  Assim, caso a Medida Provisória nº 959 não seja convertida em lei, a LGPD voltaria a ter início em 14 de agosto de 2020, nos termos do artigo 62, §3º, da Constituição Federal.

Tal vigência seria limitada apenas pela eventual sanção do Projeto de Lei nº 1.179/2020, aprovado no Senado Federal e sob análise da Câmara dos Deputados, o qual dispõe, dentre outras coisas, sobre alteração da data de entrada em vigor de prescrições da LGPD relacionados a sanções administrativas, quais sejam, os artigos 52 a 54, que teriam eficácia apenas a partir de 1º de agosto de 2021.

Analisando os cenários apresentados, infere-se que a decisão do STF em relação à Medida Provisória nº 954 demonstra inclinação do órgão quanto à antecipação da LGDP – ou, no mínimo, à garantia do direito fundamental à privacidade. Isto significa que, ainda que aprovada no Congresso, caso a Medida Provisória nº 959 seja alvo de ADI questionando sua constitucionalidade, é possível que o STF tome o mesmo entendimento adotado no julgamento da Medida Provisória nº 954, adiantando novamente a aplicabilidade da LGPD.

O trabalho de adequação à LGPD consiste em um minucioso e intenso processo de mapeamento de todos os estágios em que ocorrem qualquer espécie de tratamento e/ou coleta de dados e informações pessoais.  Muito embora, a princípio, as empresas não possam ser punidas retroativamente por infrações ocorridas entre os dias 14 e 27 de agosto de 2020, e apesar da potencial prorrogação da entrada em vigor das sanções previstas na LGPD, é recomendável que elas se adequem o quanto antes à nova norma.

Equipe de Mercado Financeiro e de Capitais – VBSO Advogados