CVM se manifesta a respeito do não enquadramento de tokens de crédito de carbono como valores mobiliários

CVM se manifesta a respeito do não enquadramento de tokens de crédito de carbono como valores mobiliários

O VBSO Advogados e a Canopée Gestão Ambiental e Florestal S.A. (“Canopée”) submeteram à Comissão de Valores Mobiliários (“CVM” ou “Autarquia”) consulta pública a respeito do eventual enquadramento como valores mobiliários, de ativos digitais tokens a serem denominados comercialmente de Carboreal representativos de créditos de carbono (“Consulta”).

A Canopée tem por objeto o desenvolvimento de projetos sustentáveis envolvendo ativos florestais com o objetivo, entre outros, da geração de créditos de carbono a partir do manejo e conservação de tais ativos.  Nesse sentido, a Canopée é responsável pela identificação de terras para plantio e desenvolvimento sustentável de florestas no país, seu monitoramento e emissão de tokens representativos de uma determinada quantidade de toneladas de gás carbônico absorvida pela floresta com base em certificação emitida por entidade autorizada para fins de composição do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL.

A Canopée será responsável pelo monitoramento e conservação do ativo florestal e garantirá a conservação da quantidade de CO2 absorvida por um determinado período de tempo.  O adquirente do Carboreal terá direito a utilizar seu token dentro do mecanismo de compensação de emissão de carbono, terá acesso aos dados sobre o ativo florestal e terá liberdade de negociar seu ativo digital com terceiros.  O token, em si, não confere nenhum direito de remuneração ou participação em resultados relativos ao ativo florestal ou qualquer outro empreendimento.

Nesse sentido, de acordo com a Lei 6.385, de 6 de dezembro de 1976, afora os demais títulos expressamente listados, um determinado título somente será considerado valor mobiliário se enquadrar-se no inciso IX, o qual estabelece a definição de título ou contrato de investimento coletivo (“CIC”) sendo aqueles “quando ofertados publicamente, (…) que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros”.

A redação dada pela lei para definir o CIC como valor mobiliário é claramente inspirada no conceito de security do direito norte-americano.  Nesse sentido, o inciso IX do artigo 2º da Lei nº 6.385/76 introduz 4 (quatro) elementos distintivos de um valor mobiliário, inspirados no Howey Test: (i) título ou contrato que prevê o investimento de recursos em empreendimento coletivo; (ii) que gere direito de participação, de parceria ou remuneração (i.e., com a expectativa de obter lucro); (iii) resultante dos esforços advindos do empreendedor ou de terceiros que não o próprio investidor; e (iv) que sejam ofertados publicamente.

Foi esse o mecanismo usado pela CVM no Ofício nº 8/2021/CVM/SRE (“Ofício”) para emitir parecer favorável à Consulta de modo a considerar que o Carboreal não possui características que permitam enquadrá-la como uma oferta pública de valores mobiliários, e, portanto, tal oferta encontra-se fora do âmbito da competência da CVM.

A Autarquia inferiu estarem presentes 2 (dois) elementos do Howey Test: a existência de oferta pública e de investimento formalizado por meio de título ou contrato. Por outro lado, a CVM entende que não existe regime de participação, remuneração ou parceria, tendo, na verdade, uma função de troca, possibilitando a compensação de créditos gerados ou, no máximo, um ganho (ou perda) por conta da oscilação do preço do ativo no mercado.

A Procuradoria Federal Especializada (“PFE”), corroborando com a manifestação da Superintendência de Registros de Valores Mobiliários, também se manifestou sobre a questão salientando a inexistência um empreendimento comum entre a Canopée e os adquirentes primários dos títulos. Isso porque a expectativa de ganho da Canopée terá relação com o número de créditos de carbono, que as áreas por ela conservadas produzirem e da efetiva alienação dos “carboreais” que emitir. Já os adquirentes primários têm sua expectativa de ganho relacionada à diferença entre o custo de aquisição dos ativos e o preço que obtiverem com a revenda.