Em maior recuperação judicial já decretada no país, STJ reconhece a competência de tribunal arbitral para temas relacionados a direitos dos acionistas da recuperanda

Em maior recuperação judicial já decretada no país, STJ reconhece a competência de tribunal arbitral para temas relacionados a direitos dos acionistas da recuperanda

Em recente decisão, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) reconheceu, por 5 (cinco) votos a 2 (dois), que a análise acerca de temas relacionados aos direitos dos acionistas da OI S.A. (“Companhia”), operadora telefônica que integra grupo econômico cuja recuperação judicial é a maior já decretada no Brasil, é de tribunal arbitral e não da justiça comum, com base em previsão estatutária da Companhia que prevê a adoção da via arbitral para solução de litígios societários.

O plano de recuperação judicial da Companhia foi aprovado em Assembleia Geral de Credores e devidamente homologado pelo juízo competente. A controvérsia em questão, no entanto, respalda-se no fato de ter constado do plano de recuperação judicial disposição prevendo a realização de aumento do capital social da Companhia, mediante a capitalização de parte de créditos quirografários, com a consequente emissão de ações ordinárias e bônus de subscrição, a serem conferidos como vantagem adicional aos credores da Companhia que subscreverem as ações objeto do aumento.

A fim de que fossem cumpridas as disposições do plano de recuperação judicial, foi realizada reunião do Conselho de Administração da Companhia, cuja ordem do dia era tratar sobre as medidas necessárias ao aumento de capital social.

Diante disso, uma das acionistas minoritárias da recuperanda – detentora de, aproximadamente, 23% das ações de emissão da Companhia, deu inicio em procedimento arbitral, com fundamento no Estatuto Social da Companhia, a fim de que fosse determinada a suspensão dos efeitos relativos às deliberações adotadas em referida reunião do Conselho de Administração.

Frente ao deferimento do pedido da acionista minoritária pelo juízo arbitral, o qual determinou a “suspensão de efeitos da eventual aprovação de qualquer deliberação que verse sobre as matérias constantes da pauta da Reunião do Conselho de Administração”, foi suscitado conflito positivo de competência entre o juízo arbitral e o órgão do Poder Judiciário em que tramita a recuperação judicial da Companhia.

Conforme exposto no voto da Ministra Nancy Andrighi, acatado por outros 4 (quatro) dos 7 (sete) Ministros que compuseram a seção de julgamento, a cláusula compromissória inserida no Estatuto Social da Companhia “obriga a sociedade, seus acionistas e administradores a resolver, por meio de arbitragem, toda e qualquer disputa ou controvérsia que possa surgir entre eles relacionada a disposições da Lei das S.A. ou de seu Estatuto e, como é cediço, as questões relacionadas a aumento de capital social – objeto da controvérsia que deu ensejo à apresentação do conflito de competência – encontram regramento específico na Lei das S.A. (arts. 166 e seguintes), além de, no particular, do estatuto social da recuperanda”.

 A Ministra apontou, ainda, que a questão a ser analisada pelo tribunal arbitral neste caso diz respeito exclusivamente à invalidade da formação da vontade da Companhia quanto às disposições expressas no plano de recuperação judicial.

Uma vez que (i) as deliberações sobre o plano recuperacional – apesar da soberania da assembleia de credores, estão sujeitas aos requisitos de validade dos atos jurídicos em geral (e que estes requisitos, por sua vez, estão sujeitos a controle jurisdicional) e (ii) a sociedade empresária tem sua vontade formada a partir de deliberações tomadas por seus órgãos, os quais atuam em conformidade com as atribuições que lhe são conferidas pela lei e/ou pelo estatuto, enquanto referidos órgãos não vincularem a sociedade às cláusulas do acordo recuperacional, não existirá manifestação de vontade da pessoa jurídica e, portanto, não se constitui o vínculo negocial (uma vez que a vontade integra o plano de validade do negócio jurídico).

Assim, tendo em vista que (i) as questões submetidas ao juízo arbitral pela acionista minoritária da Companhia estão relacionadas à verificação da licitude da manifestação de vontade da devedora quanto à implementação do aumento de seu capital social (matéria, portanto, de natureza societária para a qual o Estatuto Social da Companhia prevê adoção da via arbitral para solução de conflitos) e (ii) a concessão da recuperação judicial não afasta a aplicação das normas previstas na Lei das S.A. e/ou no Estatuto Social concernentes aos atos interna corporis da sociedade por ações, foi reconhecida a competência do juízo arbitral no caso sob análise.

Ressalva-se, ainda, que o reconhecimento da competência do juízo arbitral não subtrai a competência do juízo recuperacional, sendo absolutamente possível a convivência de ambos de forma harmônica, exigindo-se, para tanto, que sejam respeitadas suas respectivas esferas. Conforme exemplificado pela Ministra Nancy Andrighi, “caso o tribunal arbitral decida que determinados acionistas foram impedidos indevidamente de deliberar acerca das operações societárias constantes do plano, caberá ao juízo da recuperação adotar as medidas para alcançar esse fim, o que poderá resultar na alteração do plano mediante acréscimo de um aditivo, com a alteração de cláusulas especificas, ou em simples ratificação do conteúdo aprovado”.