MARCO LEGAL DO CÂMBIO ENTRA EM VIGOR E CMN E BACEN REGULAMENTAM AS ATIVIDADES

MARCO LEGAL DO CÂMBIO ENTRA EM VIGOR E CMN E BACEN REGULAMENTAM AS ATIVIDADES

No último dia de 2022, entrou em vigor a Lei nº 14.286, de 30 de dezembro de 2021, que instituiu o novo marco legal do mercado de câmbio no Brasil (“Lei Cambial”), com o objetivo de modernizar, simplificar e consolidar as normas relativas ao mercado de câmbio brasileiro. A nova Lei Cambial revogou uma série de normas esparsas e unificou todas em único instrumento.

Dentre as principais inovações trazidas pela Lei Cambial, destacam-se:

  • a elevação do valor que deve ser declarado em moeda estrangeira em espécie, no ato de entrada ou saída do país, de R$10 mil para US$10 mil;
  • a ampliação do rol de situações que permitem a estipulação de pagamento em moeda estrangeira de obrigações exequíveis no território nacional;
  • a autorização para realização de compensação privada de créditos ou de valores entre residentes e não residentes, antes vedada pela legislação; e
  • a permissão aos bancos autorizados pelo Banco Central do Brasil (“BCB”), a dar cumprimento a ordens de pagamento em reais recebidas do exterior ou enviadas para o exterior, por meio da utilização de contas em reais mantidas nos bancos, de titularidade de instituições domiciliadas ou com sede no exterior e que estejam sujeitas à regulação e à supervisão financeira em seu país de origem.

Nesse sentido, no fim de 2022, o Conselho Monetários Nacional (“CMN”) e o BCB publicaram novos normativos a fim de regulamentar essas disposições da Lei Cambial:

Resolução CMN nº 5.042, de 25 de novembro de 2022: Trata sobre os princípios e diretrizes que norteiam o funcionamento regular do mercado de câmbio, incluindo: (i) a competição para a prestação de serviços ao público relacionados às operações do mercado de câmbio; (ii) o atendimento das necessidades do público, em especial, liberdade de escolha, privacidade, transparência e acesso a informações claras e completas sobre as condições das operações do mercado de câmbio; (iii) a eficiência das operações realizadas no mercado de câmbio; (iv) o estímulo à inovação, considerando a legalidade das operações, e à diversidade de modelos de negócio; (v) a redução de custos de transação no mercado de câmbio; (vi) a inclusão financeira; (vii) a confiabilidade e a qualidade dos produtos e serviços ofertados no mercado de câmbio; e (viii) a integridade, a conformidade, a segurança e o sigilo das operações de câmbio ou das movimentações de valores.

Resolução BCB n° 277, de 31 de dezembro de 2022: Regulamenta a Lei Cambial, em relação ao mercado de câmbio e ao ingresso no País e à saída do País de valores em reais e em moeda estrangeira.

 No passado, a instituição autorizada a operar no mercado de câmbio era responsável por indicar a finalidade das operações cambiais, o que passa a ser responsabilidade do cliente. Apesar dessa nova atribuição ao cliente, as instituições mencionadas deverão prestar orientação e suporte técnico, inclusive por meio virtual, para os clientes que necessitarem de apoio para a correta classificação de finalidade da operação no mercado de câmbio.

A forma de celebração de operação de câmbio passa a ser livre, devendo ser observado que, no caso de operação celebrada com cliente, a instituição autorizada a operar no mercado de câmbio deve comprovar o consentimento do cliente com as condições pactuadas.

Por meio da avaliação do cliente e as características da operação, a instituição autorizada a operar no mercado de câmbio poderá requisitar ou dispensar, conforme sua própria avaliação de risco, informações e documentos comprobatórios.

Além das mudanças mencionadas, o BCB também equiparou os requisitos de abertura, manutenção e movimentação das contas em reais dos não residentes com as contas dos residentes. Embora a regra seja o tratamento equânime, a resolução traz algumas exigências: (i) a manutenção das contas deve ocorrer em instituição autorizada a operar no mercado de câmbio; (ii) limite de R$100 mil por movimentação no caso de conta de pagamento pré-paga em reais; (iii) prestação de informação sobre valores agregados de movimentações a crédito e a débito de contas tituladas por embaixadas e organismos internacionais; e (iv) a movimentação de interesse de terceiros é limitada a conta titulada por instituição não residente sujeita à regulação e à supervisão financeira no país de origem, situação em que deve haver avaliação sobre apresentação de documentação assim como prestação de informações ao BCB em estipuladas situações.

Adicionalmente, as instituições autorizadas a operar no mercado de câmbio devem se atentar ao envio de informações das operações de câmbio ao BCB. Em regra, o envio das informações continuará a ser efetuado no mesmo dia de sua realização, entretanto, a resolução permite que as operações de câmbio de até US$ 50 mil, ou seu equivalente em outra moeda, não sejam sujeitas ou vinculadas a registro de capitais estrangeiros, tendo até o dia 5 do mês subsequente ao da sua realização para prestar informações.

Por fim, a resolução também dispõe sobre a forma, os limites e as condições de ingresso no País e saída do País de moeda nacional ou estrangeira, assim como define os tipos de instituições autorizadas a operar no mercado de câmbio. Quanto a esse mercado, a norma regulamenta as operações de câmbio em relação ao adiantamento, liquidação, alteração, prorrogação, cancelamento e baixa.

Resolução BCB n° 278, de 31 de dezembro de 2022: Regulamenta a Lei Cambial, em relação ao capital estrangeiro no País, nas operações de crédito externo e de investimento estrangeiro direto, bem como a prestação de informações ao BCB.

A partir dessa norma complementar, o responsável pela prestação de informações relativas a crédito externo e a investimento estrangeiro direto ao BCB deverá manter à disposição do BCB a documentação comprobatória das informações prestadas pelo prazo de 10 anos. Para fins regulamentares, será caracterizado como responsável: (i) o devedor, no caso de operações de crédito externo; ou (ii) o receptor, no caso de investimento estrangeiro direto, considerando faixas de valores e condições específicas.

Importante ressaltar que a prestação de informações deverá ser realizada pelo responsável tanto nos casos de ingresso de recursos no País quanto nos casos em que estes sejam mantidos no exterior, nas seguintes situações: (i) empréstimo direto, emissão de títulos no mercado internacional, emissão de títulos de colocação privada no mercado interno e financiamento, inclusive de organismos internacionais, sempre que o valor da operação de crédito externo for igual ou superior a US$ 1 milhão; (ii) a importação financiada de bens ou serviços com prazo de pagamento superior a 180 dias, sempre que o valor da operação de crédito externo for igual ou superior a US$500 mil ou seu equivalente em outras moedas; e (iii) o recebimento antecipado de exportação e arrendamento mercantil financeiro externo, com prazo de pagamento superior a 360 dias, sempre que o valor da operação de crédito externo for igual ou superior a US$1 milhão ou seu equivalente em outras moedas. Em relação ao investimento estrangeiro direto, para fins de enquadramento, a movimentação deve ser superior a US$100 mil.

Destaca-se também que não será mais necessário a prestação de informações ao BCB de contratos entre residentes e não residentes referentes ao uso ou cessão de patentes, de marcas de indústria ou de comércio, fornecimento de tecnologia, bem como os relacionados à prestação de serviços técnicos e assemelhados, ao arrendamento mercantil operacional externo e ao aluguel e afretamento.

Ainda, a norma extingue a restrição das remessas ao exterior para pagamentos de principal e juros nas operações de crédito externo em que não houver ingresso de recursos no País, ao mesmo tempo em que passa a requisitar a prestação de informações a respeito das operações de crédito externo com recursos não ingressados, dentro de determinados critérios indicados na norma.

Resolução BCB n° 281, de 31 de dezembro de 2022: Regulamenta a Lei Cambial em relação ao capital estrangeiro no País, nas operações de crédito externo e de investimento estrangeiro direto, bem como a prestação de informações ao Banco Central do Brasil em decorrência das disposições transitórias da resolução anterior.

Em caráter transitório, a resolução mantém a realização de operações simultâneas de câmbio nos casos de: (i) conversão de haveres no Brasil de não residentes em capital estrangeiro sujeito a prestação de informações ao BCB; (ii) transferência entre modalidades de capital estrangeiro sujeito a prestação de informações ao BCB; (iii) repactuação e assunção de operação de crédito externo de empréstimo direto e de lançamento de títulos no exterior sujeita a prestação de informações à autarquia mencionada; e (iv) realização de investimentos por meio de conferência internacional de ações ou outros ativos.

Permanece também o procedimento de informar, no prazo de 30 dias contados da data de ocorrência de evento, no sistema de prestação de informações disponibilizado pelo BCB as atualizações do patrimônio líquido, do capital social integralizado da sociedade receptora e do percentual de capital integralizado por cada investidor estrangeiro e as movimentações subsequentes.

Salienta-se que foi estabelecido que a declaração periódica anual de investimento estrangeiro direto referente à data-base de 31 de dezembro de 2022 deve ser prestada por meio do sistema do censo de capitais estrangeiros.

Resolução BCB n° 279, de 31 de dezembro de 2022: Regulamenta a Lei Cambial para dispor sobre o capital brasileiro no exterior.

 Essa resolução esclarece a possibilidade de aplicação do capital brasileiro no exterior ser efetuada em qualquer modalidade regularmente praticada no mercado internacional. Nesse sentido, a autarquia normatizou, a fim de não restar dúvidas, que as operações de derivativos realizadas no exterior também podem ser efetuadas em qualquer modalidade regularmente praticada no mercado internacional em bolsas ou em mercado de balcão.

Quanto à prestação de informações do capital brasileiro no exterior, os pisos declaratórios e a periodicidade das declarações foram mantidos em: (i) US$ 1 milhão ou em seu equivalente em outras moedas para a declaração anual; e; (ii) U$100 milhões ou seu equivalente para as declarações trimestrais. 

No mais, o capital brasileiro no exterior passou a ser equiparado aos financiamentos, aos empréstimos diretos e aos créditos comerciais concedidos no País a não residentes.

Resolução BCB n° 280, de 31 de dezembro de 2022: Regulamenta a Lei Cambial em relação à definição de residente e de não residente a ser aplicada para pessoas físicas e jurídicas 

Para fins da regulamentação do mercado de câmbio, bem como assuntos correlatos presentes na Lei Cambial, a resolução estabeleceu uma conceituação uniforme quanto à residente e de não residente, aplicados para pessoas físicas e jurídicas, com o objetivo de que seja aumentada a segurança jurídica nas operações no âmbito do mercado de câmbio, para o capital estrangeiro no País e para a prestação de informações ao BCB.

Será considerada residente a pessoa física: (i) que resida no Brasil em caráter permanente; (ii) que se ausente do País para prestar serviços a partir do exterior para a Administração Pública Federal brasileira; (iii) que se encontre no Brasil com autorização de residência deferida por prazo indeterminado; (iv) que se encontre no Brasil com visto temporário, com permanência há mais de doze meses consecutivos no Brasil ou que trabalhe com vínculo empregatício ou desenvolva atividade econômica no País; (v) brasileira que, na condição de não residente, entre no País com ânimo definitivo; e (vi) residente que se retire em caráter temporário do território nacional, durante os primeiros doze meses consecutivos de ausência.

Será considerada como não residente a pessoa física: (i) que não se enquadre nas hipóteses previstas para a sua qualificação como residente; (ii) que se retire em caráter permanente do território nacional; (iii) que, na condição de não residente, preste serviço a partir do Brasil como funcionária de governo estrangeiro; e (iv) residente que se ausente do Brasil em caráter temporário e que complete doze meses consecutivos de ausência.

Em relação à pessoa jurídica, esta será considerada residente a entidade domiciliada ou com sede no Brasil e, não residente, a entidade domiciliada ou com sede no exterior e que não se enquadre nas hipóteses de residência.

Resolução BCB n° 282, de 31 de dezembro de 2022:

Por último, esta norma altera a Circular nº 3.978, de 23.1.2020, que dispõe sobre os procedimentos destinados à prevenção dos crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores, para prever que, no caso de operações no mercado de câmbio, as instituições autorizadas devem manter registro e guarda dos documentos comprobatórios exigidos para a realização de operações nesse mercado, conforme critérios alinhados à sua respectiva avaliação interna de risco.

A Equipe de Direito Bancário do VBSO está à disposição para esclarecimentos acerca da lei e suas novas resoluções, tal como seus potenciais impactos em futuras transações.