Sócio falido pode exercer atividade comercial, decide Justiça Paulista

Sócio falido pode exercer atividade comercial, decide Justiça Paulista

Em entendimento inédito, o juiz da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Capital do Estado de São Paulo, autorizou um empresário ao exercício de atividades comerciais antes do encerramento do processo falimentar da companhia da qual era sócio. A decisão se destaca, visto que contraria a legislação brasileira de insolvência empresarial que, em seu artigo 102, dispõe que o falido fica inabilitado para exercer qualquer atividade empresarial a partir da decretação da falência e até a sentença que extingue suas obrigações.

Ainda nos termos da Lei nº 11.101/2005, as obrigações do falido serão extintas ao término do processo de falência somente se ocorrer o pagamento integral dos créditos ou mediante o pagamento de mais de 50% dos créditos quirografários. Caso tais hipóteses não ocorram, as obrigações serão extintas apenas após o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados do encerramento do processo de falência, se o falido não tenha sido condenado por prática de crime falimentar, ou de 10 (dez) anos, em caso de condenação por crime previsto pela lei falimentar.

Ao julgar o caso, entretanto, o magistrado entendeu que a vinculação do início da contagem do prazo de reabilitação do falido ao efetivo encerramento do processo de falência representa grave violação aos direitos fundamentais do cidadão. Isto, pois, conforme afirma o juiz e se comprova pela atuação na área, os processos de falência são demasiadamente longos, sem prazo certo de encerramento, e duram muitos anos, o que acaba por submeter o empresário a uma pena de inabilitação bastante longa. No caso em questão, o processo já tramita por mais de um decênio, e não deverá ser encerrado com brevidade.

Diante do histórico e da problemática sob análise, o magistrado aplicou, de forma contrária às posições atualmente dominantes, entendimento relacionado ao prazo prescricional da investigação da prática de crime falimentar, para concluir que é razoável admitir que o início do prazo de reabilitação do falido possa ter início a partir da data da decisão judicial que determinou o “arquivamento” da investigação da prática de crime falimentar. Desta feita, calculou o prazo de reabilitação de 5 (cinco) anos previsto na Lei nº 11.101/2005 a partir dessa decisão judicial, considerando que as obrigações do falido estariam já extintas e que o mesmo poderia voltar ao mercado.

Dentre outras fontes, a decisão judicial inovadora pauta-se no Direito Comparado para justificar seu racional, trazendo o conceito do fresh start do Direito Norte-Americano, cuja ideia é permitir que o devedor retome suas atividades no mercado após os trâmites falimentares prescritos. A ideia é justamente mitigar a punição inerente ao processo de falência para que o empresário, que tomou risco em prol do desenvolvimento do mercado e acabou por se superendividar, tenha a crise como um ato de aprendizado, e não se torne um pária.

Não obstante a importante reflexão realizada na decisão que realmente inova na seara em questão, fato é que a mesma é claramente contrária às previsões expressamente previstas na Lei de Falências, fato que está longe de ser inédito nas decisões relacionadas ao Direito Falimentar, que têm, repetidamente, refutado a aplicação das previsões legais, relativizado garantias, permitido o acesso de pessoas não previstas na lei ao favor legal, dentre outras.

Portanto, apesar de louvável a decisão em questão, que de fato se coaduna com a sistemática de uma lei de insolvência que não visa à completa punição e exclusão vitalícia do empresário do mercado, a impressão que fica é de que – dado o sistema positivista que rege nosso ordenamento – o âmbito adequado para a proposta de mudanças inovadoras seria o legislativo, em especial no presente momento, de alteração da Lei de Falências, e não o âmbito jurisprudencial, que deveria ter a lei como fonte primordial.