TJSP SUSPENDE A EXCUSSÃO DE RECEBÍVEIS CEDIDOS FIDUCIARIAMENTE

TJSP SUSPENDE A EXCUSSÃO DE RECEBÍVEIS CEDIDOS FIDUCIARIAMENTE

Em decisão publicada no dia 23 de agosto nos autos do agravo de instrumento nº 2193469-45.2021.8.26.0000, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) determinou, em caráter liminar, a suspensão, por parte de instituições financeiras, dos descontos de cessão fiduciária de títulos creditórios e recebíveis de empresa em recuperação judicial.

De acordo com o relator do caso, o desembargador Grava Brazil, “no que se refere aos direitos creditórios cedidos, sobretudo sobre o crédito futuro, a maioria desta C. Câmara vem entendendo que apenas deve ser considerado extraconcursal o título cedido ou o recebível aperfeiçoado antes da distribuição do pedido recuperacional, tratando-se, pois, de crédito performado; em contrapartida, o crédito a performar, ou seja, os recebíveis cedidos formados posteriormente à distribuição da recuperação, tratar-se-iam de crédito concursal”. 

Embora passível de reversão quando do julgamento definitivo do recurso, o entendimento adotado gera enorme preocupação entre as instituições financeiras.

Do ponto de vista comercial, nota-se que a cessão fiduciária, que figura entre as garantias mais utilizadas pelos bancos e, portanto, aquela que tende a propiciar concessões de financiamentos a taxas mais baixas justamente em razão da expectativa de maior nível de segurança ao credor, renova seus ares de incerteza, podendo levar as instituições financeiras a repensarem a utilização de referida garantia e, consequentemente, as taxas mais benéficas que as acompanham.

No âmbito estritamente jurídico, por sua vez, a Lei de Recuperação Judicial e Falências é clara em afirmar que “tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais (grifo nosso).  Ora direitos creditórios se enquadram na categoria de bens móveis e, ainda que de existência futura, uma vez performados, isto é, tornados exigíveis, eles integram a propriedade fiduciária do credor e automaticamente deveriam estar fora da esfera patrimonial do devedor atingida pelos efeitos da recuperação.  Ainda, a posição do TJSP esbarra na legislação de insolvência e na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, segundo as quais os recebíveis cedidos fiduciariamente não se enquadram na categoria de “bens de capital” que autoriza a adoção, pelo Poder Judiciário, de medidas que impeçam, enquanto durar o chamado stay period, a excussão da garantia pelo credor titular.

Dessa forma, constata-se que a recente e ampla reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falências, que, a despeito de diversas demandas em sentido contrário, corroborou a previsão de que apenas os “bens de capital” podem ser objeto de blindagem patrimonial durante o stay period, não foi suficiente para impedir eventuais interpretações em prol da relativização parcial e/ou total de previsões legais de forma casuística, em contrariedade à segurança jurídica que deve reger as relações comerciais.