Procedimentos do processo de recuperação judicial podem ser alterados por negócios jurídicos processuais, decide Vara especializada da Capital

Procedimentos do processo de recuperação judicial podem ser alterados por negócios jurídicos processuais, decide Vara especializada da Capital

“Formalista”, “excessivamente rígido” e “moroso”, são alguns dos adjetivos mais utilizados pelos operadores do direito para criticar o procedimento de recuperação judicial estabelecido pela Lei nº 11.101/2005. O cenário em questão, contudo, pode estar prestes a sofrer alterações.

Em decisão que deferiu o processamento do pedido de recuperação judicial do Grupo Abril[1], o magistrado Paulo Furtado de Oliveira Filho, da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca de São Paulo-SP, autorizou o Administrador Judicial a convocar assembleia de credores para a deliberação acerca da utilização de negócios jurídicos processuais no âmbito de referido processo recuperacional.

Dentre os procedimentos da recuperação judicial passíveis de modificação por via dos negócios jurídicos processuais, a decisão apontou as seguintes possibilidades:

  • a alteração da forma de manifestação da vontade dos credores a respeito do plano de recuperação judicial, de modo a permitir o voto por escrito, e não mais em assembleia;
  • a introdução de novas formas de comunicação processual, principalmente por meio da substituição das custosas e morosas publicações de editais pela comunicação através do site do administrador judicial;
  • o processamento das impugnações de crédito em via extrajudicial, perante o Administrador Judicial, com posterior protocolo efetuado perante o juízo apenas para a decisão final pelo magistrado da causa;
  • o estabelecimento da calendarização processual, a fim de tornar mais previsíveis os atos a serem praticados em juízo;
  • a redução do prazo de fiscalização judicial, atualmente fixado em 2 (dois) anos, podendo ser estabelecido que a recuperação judicial será encerrada a partir da decisão que homologar o plano de recuperação judicial.

 

A última medida, de acordo com a decisão, não obstante o caráter aparentemente polêmico de que dispõe, apresenta o potencial de gerar ganhos tanto para credores, que continuarão a dispor dos meios judiciais necessários para exigir o cumprimento do plano de recuperação judicial, quanto para o devedor, que poderá, diante do encerramento do processo recuperacional, normalizar o mais rápido possível a sua atuação empresarial, principalmente no tocante à obtenção de crédito perante instituições financeiras. Além disso, trata-se de medida já presente no rol de alterações da Lei nº 11.101/2005 proposto pelo Projeto de Lei nº 10.220/2018, atualmente em trâmite no Congresso Nacional.

Independentemente das alterações procedimentais propostas, porém, faz-se necessário tecer elogios à decisão que aproxima os negócios jurídicos processuais do processo de recuperação judicial estabelecido pela Lei nº 11.101/2005, haja vista a plena compatibilidade entre ambos os institutos.

Afinal, de um lado, temos processo judicial cujo trâmite se dá de forma extremamente morosa e mediante rito marcado por procedimentos rigidamente estabelecidos em lei; de outro, tem-se instituto marcadamente voltado a, mediante a atribuição às partes envolvidas de poder livremente definir os aspectos procedimentais de acordo com as exigências do caso concreto, tornar o processo judicial mais célere e flexível, justamente as características que os operadores de direito desejam atribuir ao procedimento da recuperação judicial atualmente vigente, reduzindo as críticas a ele direcionadas e propiciando o cumprimento efetivo de seu objetivo social.

[1] Processo cadastrado sob o nº 1084733-43.2018.8.26.0100, em trâmite perante a 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais da Comarca de São Paulo-SP.